segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Casal de andarilhos


Cheguei hoje cedo da rua e tive uma surpresa impactante. No calçada, um casal de andarilhos venezuelanos com duas crianças pequenas, o moço estava voltando da bicicletaria aqui do lado. Extremamente simpáticos e muito educados, me pediram licença para usar a calçada por algumas horas. Eu disse que sim, sem problemas. A moça era muito bonita, o moço também, ambos de traços bem feitos, ele de “canecalon” no cabelo. Roupas surradas, bermuda e camiseta. A criança menor se chama Tsunami. A mãe disse que ele veio como uma onda. Engraçado é que ela não disse esse nome como algo pejorativo, mas grandioso. Ela tinha conhecimento de que Tsunami é uma onda gigastesca, mas provavelmente nem tomou conhecimento da tragédia que assolou a Indonésia. Já o maior se chama “Ignaro”, me parece, que seria algo relacionado a sonho, não sei se é assim que se escreve. Nomes fortes e significativos, escolhidos a dedo, e com explicação para eles. Pararam para arrumar as bicicletas e com isso desmontaram sua casa, seus pertences (roupas, cobertas, uns poucos utensílios, um radinho, entre outras coisas) de cima dela. O destino agora é a Bolívia. Minha mãe conversou com eles um pouco, e eles disseram que haviam ganhado arroz cru. Queriam trocar com ela por arroz cozido. Claro que não trocamos, fizemos uma marmita para o almoço e demos outras coisas, bolachas para as crianças, bananas e uma lata de leite em pó. Ficaram muito agradecidos, e desejaram coisas boas, com muita sabedoria. O menorzinho tinha acabado de acordar, e estava manhosinho. Piscava e fazia charme para nós. O maior, brincando com a roda da bicicleta recém arrumada, chamava pelo menor, parecendo ser bastante ativo. Crianças lindas, apesar de mal arrumadas, descabeladas. E os pais, orgulhosos, nos falavam sobre os pequenos. Fiquei impressionada! Como pode alguém viver assim, e ser feliz. Não vi as dificuldades nos rostos deles...vi algo diferente. Incrível! Fiquei com um misto de dó e inveja da segurança e cumplicidade dos dois, e do carinho que demonstram uns com os outros! Tive vontade de conversar com eles a tarde toda, pois escutei as conversas e os risos das crianças...felizes. A mãe brincando com eles, o pai cantando para eles, e as gargalhadas ecoando. Quantos filhos de nossa sociedade convencional não gostariam hoje que os pais brincassem e cantassem para eles. E, por outro lado, quantas coisas não são ceifadas dos filhos dos andarilhos, como escola, por exemplo? Mas também, qual é o limite que nos fará perceber quem pode ser mais feliz, pois calculem o que essas crianças não aprendem mundo afora? De fato, é estranho imaginar que existam outras formas de vida diferentes da nossa, ainda mais uma assim, parecendo ser por opção, e não exclusivamente por necessidade. É de se parar para pensar no que fazemos todos os dias com a nossa vida! E é por essas e por outras que creio que felicidade é o que de mais simples existe no mundo. E nós, pobres capitalistas, nos afastamos cada vez mais dela, achando que acumular dinheiro, estresse e rugas, e em alguns casos cânceres, é o único caminho para chegar até ela. Essa tal felicidade é mesmo muito misteriosa!

Vanessa Zordan 

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