À Carla Tocchet (formadora do
programa Ler e Escrever)
Não bastasse a audácia de se
despedir, ela ainda usa o “meu” poeta preferido, junto com um dos seus (dele)
poemas mais lindos e “meu” preferido como sendo ambos “seus” preferidos. Ela
deixou com isso um buraco aqui dentro. Na verdade, ela deixou um buraco aqui
dentro com a audácia de se despedir. Audácia é pouco, é eufemismo. Mesmo que eu não estivesse mais...mesmo que eu
já tivesse saído de cena, deixado o barco, um dos meus pés ainda estava na
proa. Minha eterna proa, meu eterno barco do qual ela era uma das comandantes.
Um dos meus grandes modelos. Estive nesse
barco por 6 anos, e o mar que naveguei com ela foi imensurável de se
calcular...milhas e milhas de tempestades e pores de sol. Ajudou-me a ficar
firme quando a única saída que me parecia mais plausível era desistir. Então eu
recebia a dose mensal dos ensinamentos dela, desse feitiço que ela tem e que
traz à tona a percepção de como proceder, de que é possível vencer os
obstáculos na educação e de que não é tão penoso assim. Ou de que sim, é penoso,
porém ela me abria as portas de um mundo novo, cheio de possibilidades para
quem acredita, tem vontade e amor pelo que faz.
Por vezes ganhei seu jeito de
fazer as coisas, suas expressões, “bacanisses”, neologismos que impregnaram –
“De onde essa Carla tira essas coisas?” – e fizeram parte mim...na verdade, fazem
parte de mim. Nunca deixarão de fazer parte de mim, da profissional que estou
me tornando a cada dia, e de todos que tiveram o privilégio de viajar nesse
barco.
Mas ela teve a audácia de se
despedir... sabemos que não é um “adeus”, e sim um “até logo”. Sabemos também
que o que ficou dela em cada um de nós será sempre ampliado, pois um formador
de verdade é aquele que deixa seus pupilos em condição para caminhar sozinhos
e de forma crítica. Ficaremos aqui, sem enxergá-la com os olhos, mas tendo a
certeza de que seu brilho continua em nós, através dos conhecimentos que
construímos juntas, e que fazemos questão de espalhar feito vento por aí.
As pessoas se eternizam pela
intensidade com que se doam. O resíduo dela em nós já é eterno.
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